Quando os primeiros vislumbres de Moonlight acontecem, já impressionam pela frase inicial “Todo Crioulo é uma estrela” (no original em inglês Every nigger is a Star, verso da música de mesmo nome do cantor Boris Gardiner), mas se engana quem deixa se levar pela introdução e achar que o filme é um filme sobre o gueto, mas a produção funciona sim como um instrumento de empoderamento e da voz para os cidadãos afrodescendentes.
A produção tem roteiro e direção do pouco conhecido Barry Jenkins, que faz ao longo da produção um espetacular estudo de personagem, e da mente humana, é uma grande crítica social, humanizando clichês tão batidos como o jovem pobre negro, o traficante e a mãe viciada. A violência e o preconceito são velhos conhecidos do protagonista, andando junto com a sua história. Enquanto lida com seus conflitos internos, sociedade o expõe de uma maneira ridicularizada.
A trama nos apresenta o tímido Chiron (Alex Hibbert, impecável) que mora em uma comunidade pobre de Miami, cresce exposto ao aumento gigantesco do uso de crack nos anos 80, e desde muito jovem sofre com os colegas que o tacham de termos pejorativos quanto a sua sexualidade, embora nem ele mesmo aos dez anos, saiba o que isso quer dizer. Mostra o quanto as crianças podem ser cruéis umas com outras, o quanto sofrem com a vergonha de levar o problema adiante, e ainda mais esse personagem que não encontra em casa o apoio necessário para que uma criança cresce de maneira que ele se sinta abrigado, protegido e amado. Quando ele passa a fase adolescente é interpretado por Ashton Sanders, que não mantem o mesmo nível de atuação, muito menos carismático, sem a sutileza necessária, ele tem de conduzir um personagem agora adolescente, muito introspectivo, e sofrendo muito mais bullying. Depois de uma passagem de tempo vemos o personagem ser vivido por Trevante Rhodes muito bem em sua primeira produção, conduz o personagem agora líder do tráfico local. Mas o acerto do filme é a jornada do protagonista de autoconhecimento, em nenhuma das fases em que a vida desse protagonista é dividida ele perde o entusiasmo em saber o que ele é, do que ele gosta, algo que torna esse personagem mais humano, se entrelaçando a vida de qualquer um que vai a uma sala de cinema ver o filme, independentemente da cor, gênero ou sexualidade.
As questões que a produção levanta de sexualidade e raça, ao mesmo tempo em que são simplificadas no roteiro tem peso em cena pelo realismo, essa é uma das grandes sacadas do filme, se existe um resquício de tentar estereotipar as coisas na mãe solteira que trabalha demais e busca nas drogas sua fuga do mundo real, em um trabalho arrasador da atriz Naomie Harris, outro destaque do filme é Mahershala Ali que vive uma espécie de imagem paterna para o protagonista, alguém que apesar do trabalho fora da lei, mostra que pode encontrar nessa figura uma carinho, uma atenção e um senso de responsabilidade para si.
Com uma escolha de sempre utilizar muito luz ao redor da vida triste do menino, adolescente e adultos, mostrando que a luz no fim do túnel existe, e que nada está tão perdido e tão nas trevas que não possa ser salvo, buscado para a luz, a escolha da trilha sonora nada trivial agrada, com ritmos da Miami efervescente, das casas noturnas, e utilizando MPB Brasileira tocando Caetano Veloso.
Moonlight é um filme que jamais poderia ser reduzido a uma produção de nicho, seria cometer um erro tão grava quando julgar alguém pelo rosto, ou um livro pela capa, tem nuance, tem franqueza, clareza, e muita emoção natural, arrepia ao mostra a busca eterna de todos nós em nos entendermos com quem somos, e aprendermos a aceitar quem somos, não precisa ter uma religião, uma raça, um gênero, ou uma opção sexual para entender o filme basta apenas ser que você é e respeitar o que quer que seja.
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